é impossível ter saudades do que nunca existiu. eu acho que posso dizer isso. é impossível ter boas recordações quando, simplesmente, não existem nenhumas recordações. não posso falar das ruelas da minha aldeia, nem do grupo de bons rapazes com quem me sentava a olhar os carros à beira da estrada. é isso que eu acho que posso dizer. e talvez um dia eu me case e acabe enforcado sobre a mesa da sala. como um candeeiro que não se acende.
é impossível ter vontade de voltar aos lugares onde nunca se esteve. faz-me falta um fato justo, faz-me falta uma camisa engomada. faz-me falta o maço de cigarros sobre a mesa, a máquina de escrever. faz-me falta ter ido à guerra e faz-me falta ter ido às putas. eu sento-me aqui como quem se senta a olhar para o mundo, mas não há nada para ver. posso fazer todos os projectos da vida que tudo se acaba por resumir em poucas, pouquíssimas palavras. e alguém já transformou isso num blues.
é impossível conseguir mudar o que não tem mudança. eu tomo banho todos os dias, eu faço a barba todos os dias, eu escrevo todos os dias, eu como todos os dias, eu cago todos os dias. sim, e depois? falta sempre qualquer coisa, não é? eu não posso ter certeza de nada, mas também não tenho dúvidas que tudo se há de resolver pelo pior. talvez eu continue a correr, talvez eu continue a não ter tempo, talvez eu continue a querer ter um passado, ao mesmo tempo que o construo e o abomino. e talvez acabe como um candeeiro que não se acende.
Arquivo do extinto blogue Esferovite- a vida em pedaços (13-08-2003/ 4-01-2006)
segunda-feira, maio 30, 2005
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Arquivo do blogue
-
▼
2005
(461)
-
▼
maio
(68)
- filme francês
- casalinho
- eu não sei como é
- Um editorial recusado que se salvou do lixo
- férias de mim
- trata-me por senhor
- de repente, eu
- os poemas estão escritos em francês
- talvez uma crónica de domingo
- oriente-se a oriente
- para saberes da minha verdade
- visionária
- a zanga do poeta que tem razão
- encontro
- voz
- triste américa
- surdez
- cama
- copos
- guilhotina
- gesso
- remistura
- pensamento da noite
- 00:00
- frases
- lisboa
- previsão do tempo
- anotações sobre o real dos meus olhos
- rinite alérgica
- ofício de escrita
- no começo era o verbo
- fala comigo
- a pior parte de um coração partido
- encontro virtual
- nava-lha
- teoria da repetição
- vou deixar de fazer perguntas retóricas
- a catorze de maio
- Carta a Inês de Castro
- a treze de maio
- [ a casa das mil portas ]
- quantas vezes
- marcas
- nórdico deprimido
- a aprender como se faz
- dedos
- asas cortadas voam melhor
- o espaço em volta
- a vida devia ser como no championship manager
- miopia
- ir dormir contente
- introdução a "auto-perfil"
- amor
- problemas de segurança
- era depois da morte
- balcão
- calor
- [o título que tu quiseres]
- da verdade e da mentira em L.F.C.
- exercício sobre a solidão
- simulação
- teoria da literatura - III
- de ganga...
- e um dia pensei
- wine
- escreve
- será que alguém me ouve?
- mesmo assim
-
▼
maio
(68)
Sem comentários:
Enviar um comentário