tinhas as frases arrumadas como uma criança que colhe azedas num campo que se estende da beira da estrada até a um moinho alto. tinhas as frases com sumo por dentro e eu sonhava com telefonemas teus a meio da noite. nesses telefonemas tu dizias: "tu o dia todo aí e eu o dia todo aqui. estamos sozinhos". tinhas as frases limadas e as tuas unhas, se passavam pelo meu braço, não arranhavam, arrastavam carícias.
tinhas as frases arrumadas como uma mulher que desliza sobre a calçada de face levantada e olhos escondidos em lentes escuras. havia uma música calma a soar nos nossos ouvidos e nos nossos corpos. tudo acontecia muito devagar. tinhas as frases arrumadas e as saias esvoaçantes abaixo do joelho. eu estava a uma esquina da cidade, com as mãos nos bolsos e um chapéu a cair pela testa. tu vinhas e sorrias e passavas.
tinhas as frases arrumadas como uma estudante que se sente desviada do seu caminho pelas ordens idiotas de alguns professores que nunca vão saber o que é ser-se uma jovem estudante com frases arrumadas. falavas alto na esplanada e choravas baixinho quando chegavas perto da almofada rosa do teu quarto. tinhas as frases arrumadas e eu sonhava com elas. sonhava assim: "vou estar a tarde toda sozinha em casa. vou". e depois tu arrumavas as tuas frases dentro de cadernos e eu virava-me para o outro lado da cama, a olhar a janela, mal acabado de acordar.
Arquivo do extinto blogue Esferovite- a vida em pedaços (13-08-2003/ 4-01-2006)
quarta-feira, maio 18, 2005
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5 comentários:
Das coisas mais bonitas que li nos últimos tempos... Um beijo enorme, Luís.
Eu tenho frases arrumadas tb.
Tb tenho frases arrumadas
tinha..tínhamos..e agora? ;)
beijinho*
;-)
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