Arquivo do extinto blogue Esferovite- a vida em pedaços (13-08-2003/ 4-01-2006)

domingo, novembro 27, 2005

rasganço

a cama aberta uma vez mais, descoberto o corpo quente da noite, cai uma carga de água e gelo sobre o telhado e eu cá dentro, da casa e de mim, um lenço sobre os olhos chorosos, a mão na testa que quase ferve. a cama aberta, eu, e estar sozinho neste dia assim, um lenço que se molha a cada minuto, depois largado pelo chão.

a cama aberta, a boca desligada, deixei a cabeça algures num dia onde eu não estou. não vale a pena o que possas dizer, não há proximidade que chegue ao meu abraço. puxo então a manta para os meus ombros e oiço no rádio, baixinho, a professora Berardinelli a falar vivaz de literatura. lembro-me de ela me falar de um poema. os olhos vermelhos.

a cama aberta, a boca sem nada para dizer. o frio todo lá fora e todo cá dentro. num espaço intermédio pouco ou nada resta para dizer. páro: a palavra dizer repetida. duas vezes. volto acima, talvez alguma vez mais. sim, ali. três. a cama aberta e eu, as mãos debaixo da manta. oiço. lembro-me de ela me falar de um poema, de como o lia. mas agora, pouco interessa.

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