eu tenho sempre esta cara de manhã, esta cara de não saber nada, o meu velho problema de expressão. eu tenho sempre este passo de manhã, um passo apertado entre as paredes do corredor, o cabelo despenteado, as mãos, muitas vezes, a segurarem-me de pé, porque me desiquilibro, porque me parece que vou cair.
eu tenho sempre esta cara de manhã, esta cara de não saber o que dizer, esta cara de quem está a ir embora de volta às montanhas. por muito que me custe o tempo que todo que passo sozinho, é sozinho que eu sei estar. e depois alguém me vem pedir explicações, mas não há nada para explicar. ser sozinho é como ser-se outra coisa qualquer.
eu tenho sempre esta cara de manhã, eu tenho sempre estes olhos acabados de morrer. tenho o andar ensaiado e as coisas todas nos seus lugares. durmo bem de noite e nem sempre me agrada sentir o cheiro dos outros. pego na minha roupa e deixo-a num monte, pronta a lavar. esta cara de quem está a ir embora de volta às montanhas, porque estou.
Arquivo do extinto blogue Esferovite- a vida em pedaços (13-08-2003/ 4-01-2006)
quinta-feira, setembro 22, 2005
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1 comentário:
Tanto quanto ter a mesma cara matutina é ter de reaprender de que lado ficou o despertador que atormenta, apresentar-se ao botão que quando quer acende a lâmpada, chamar de volta os chinelos que ficaram em outra história.
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