tens saudades minhas? certamente não tens saudades minhas.
saudades não são este silêncio tumular
nem esta ausência, este não saber o que fazer das palavras.
sinto cada minuto que passa como uma mão que rouba algo do meu bolso. sinto os meus passos molhados pela chuva e uma estranha quietude na cidade, agora que é inverno e nada pode negar que as coisas começam a andar ainda mais lentas. talvez sejam os meus dedos, ou qualquer coisa dentro da minha cabeça, que me faz escrever menos, pensar menos, desejar menos. o meu corpo prepara-se para hibernar. só não hiberna a constante necessidade de ser satisfeito.
mais tarde, durante o dia, haverei de contradizer todas as coisas que digo, haverei de anunciar os contrários e o seu regresso à primeira figura. para estas curvas, nada terás a dizer que se consiga ouvir. os minutos não param de se repetir, eu não paro de me repetir, nada nada pára de se repetir. chega a ser cansativo, isto, é certamente cansativo, esta inconstância tão constante. e depois oiço aquela mesma música de outros dias e deito-me a pensar se terás saudades minhas.
oiço as notícias e penso para que me serve ouvir as notícias. se saio de casa, chove-me o mundo em cima. se fico, este adormecimento de facas sobre as minhas costas. oiço música e penso para que me serve ouvir música. nenhuma arte no mundo, é o que eu sinto, nenhuma satisfação. todo se corrói lentamente à minha volta e o meu mundo, o meu vasto vasto mundo, é cada vez mais uma pequena ilha onde só falésias me levam ao mar, ao mar e à morte, nem sempre pela mesma ordem.
Arquivo do extinto blogue Esferovite- a vida em pedaços (13-08-2003/ 4-01-2006)
segunda-feira, outubro 17, 2005
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