penso: uma e quarenta e cinco de um dia qualquer, o céu nublado, as pessoas que estão na rua e eu pareço não as sentir, trânsito, muito trânsito, fazer as coisas como se a vida tivesse banda sonora, ver-me, a mim e aos que estão comigo como num plano de câmara, um dia qualquer, penso, penso, hoje não é um dia qualquer.
penso: eu a andar pela terra, devagarinho, entre os mortos. pensava que tinha medo de entrar no cemitério porque toda a gente tem medo. pensava que tinha medo de espreitar para dentro do caixão porque ninguém quer espreitar. eu a andar pela terra, os pés entre os mortos. enquanto o buraco ia sendo tapado, eu à espera. nem o meu avô, nem ninguém, não está aqui ninguém.
penso: as lágrimas que caem dos olhos das pessoas. o meu irmão lá ao fundo, à porta do cemitério, ainda tem medo. a minha avó e o meu pai ainda têm medo. as pessoas quase todas têm medo. eu estou em paz, infinita paz. não está ali ninguém. nos funerais choro sempre mais por ver chorar. eu estou em paz.
penso: uma e quarenta e cinco deste dia apagado do calendário. saio do cemitério ao lado do meu pai e uma ave sobrevoa-nos. ali está alguém, eu sei, alguém que veio ver. a minha cabeça cheia das frases todas destes dias. eu a ver a vida como se tivesse banda sonora, num filme. os sapatos sempre um pouco sujos. hoje não é um dia qualquer.
Arquivo do extinto blogue Esferovite- a vida em pedaços (13-08-2003/ 4-01-2006)
quarta-feira, abril 13, 2005
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2 comentários:
Cuidado Luís!
Os homens que pensam começam a ser raros...
;-)
Espero que estejas melhor, meu amor... Beijos.
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