enquanto sinto o calor a descer-me pela face de barba por fazer, tremem-me os braços e as pernas com o nervosismo habitual de estar sempre com a sensação de viver sobre o trapézio. fiz uma cabana dentro do meu próprio quarto, e estou agora rodeado de livros e papéis onde o excesso de letras me faz piscar os olhos, de bom míope que sou. lembro-me agora que ontem, ao entrar no elevador, os meus olhos estavam inchados. páro e tento perceber onde é que isto tem uma ligação com a poesia.
talvez seja isso que me preocupe, ou, talvez seja isso que me ocupe o espírito nesta tarde. o que é, o que origina a poesia. como se faz? procuro, a maior parte das vezes nos próprios poetas, a resposta a isto. pois de cada vez que leio algo de teórico sobre o assunto, acabo por sempre me ir encontrar no lado errado das questões que me coloco. então, pelo meio do trabalho que me dizem ir fazer de mim um homem, olho e desejo os livros de poesia. páro e tento, de novo, perceber o que é que isto tem a ver com a poesia. e, entretanto, sinto-me a avançar em alguma direcção.
era de facto impensável que eu pudesse discorrer assim sobre qualquer assunto, eu que me tento esconder tantas e tantas vezes por detrás de histórias que invento, para desviar a atenção do olhar que me é estranho. sou como aquelas personagens dos filmes cómicos que se encontram no meio da rua a apontar para o vazio quando elas próprias são o objecto da perseguição de um magote de gente. quase que para me defender, se é que isso faz algum sentido, esqueço-me sempre daquilo que escrevi nos últimos dias. e depois é como se me estivessem a falar de algo que eu deconheço quando alguém menciona um texto meu. páro e reflicto na importância que a poesia possa ter para tudo isto.
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segunda-feira, maio 31, 2004
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