faço de ti a minha coroa de espinhos, adriana, faço de ti a minha glória, o meu sangramento. sento-me no pequeno banco que tens nas traseiras, no pequeno quintal onde um dia já se plantaram alfaces e flores para pôr nas campas dos entes queridos. sento-me no pequeno banco e espero por ti. sais de casa embrulhada num lençol verde, um enorme lençol verde, saído de uma cama de casal, de cama dos teus pais, talvez. sais de casa, tens uma pequena navalha na mão. beijas-me antes de começares a desenhar-me espinhos de sangue na testa.
tenho as sobrancelhas pesadas, um sangue espesso cai-me pelas faces, pelos lábios, cai por mim, até à terra suja do teu quintal. abriste dois pequenos cortes na minha testa, debaixo da minha franja de caracóis. tento manter os olhos abertos para te ver, sorrir-te. sinto-me fraco, embriagado.ao fim de alguns minutos, sinto uma feroz vontade de te ver nua. afastas-te de mim e cortas a ponta do indicador esquerdo. depois pressionas as minhas feridas. eu urino-me pelo banco abaixo.
acordo deitado no chão. tenho a cara suja de sangue e terra, nas pernas o cheiro de urina. oiço-te rir, mas pareces-me longe. tento levantar-me, mas só sujo as mãos. remexo a terra, como que procurando um apoio para me içar desta sujidade onde me encontro. sinto-me frágil, muito frágil. ainda assim, tento não adormecer de novo, desmaiar de novo. quero ver o teu sorriso, adriana, quero ver o teu sorriso. pareces-me longe, muito longe. dói-me a cabeça. sei que não me conseguirei levantar daqui. tenho as mãos sujas. limpo-as dentro das cuecas.
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quinta-feira, julho 08, 2004
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