levantei-me definitivamente do sofá quando vi o Zagorakis a cair de joelhos no relvado enquanto levantava os braços ao céu quente de lisboa como quem agradece aos deuses a chegada de volta a ítaca. procurei numa das prateleiras do meu quarto o meu cachecol português e saí de casa, olhos caídos, a querer saborear a hora de uma serenidade reconquistada, depois de tantos nervos suados pela testa abaixo. quando saí do elevador, nunca o silêncio foi tão profundo e doloroso, como o da minha cidade anoitecida.
tenho o cachecol embrulhado no meu pescoço. sim, apesar do calor, hoje para mim é inverno. no inverno, sinto-me bem por dentro. e a derrota faz-nos sentir muito bem connosco. afinal, é ela que nos faz estar de novo sozinhos, isolados do resto do mundo. com os olhos na calçada, voltei a pensar, calmamente. ainda que não consiga sorrir, tenho pensamentos positivos, agradáveis. a única coisa que ficou sem funcionar foi a ligação para o exterior. assim me resguardo. atrás de uma cara feia.
fico pelo bar até ao fecho. entretenho-me a servir imperiais e a limpar mesas. entretenho-me a fazer piadas com a malta que se senta do outro lado do balcão. entretenho-me à procura de um canal de televisão onde se fale de futebol. entretenho-me a beber cerveja, a comer amendoins, milho frito. entretenho-me. mas sempre que pisco os olhos, ainda vejo o Zagorakis a cair de joelhos no relvado, com os braços a apontar para o céu. volto a casa. esta é a noite em voltei a dormir sossegado.
Arquivo do extinto blogue Esferovite- a vida em pedaços (13-08-2003/ 4-01-2006)
segunda-feira, julho 05, 2004
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