Arquivo do extinto blogue Esferovite- a vida em pedaços (13-08-2003/ 4-01-2006)

terça-feira, julho 27, 2004

hoje o dia vai chegar

deixa-me descer para poder encontrar o teu pescoço descoberto e inútil, arena cheia de areia da praia, bancadas feitas de fitinhas de muitas cores, rosário esperançoso de uma piscina longínqua e desfeita de arvoredos, onde eu, um dia antes de ter nascido, fechei os olhos pela última vez, salgado, pela primeira vez, sabedor do que viria depois de mim, depois de fechadas todas as portas. pensava eu, segurança, amor, segurança, amor, pensava eu, como nunca soube que poderia estar errado.

e então sou eu, eu com um corpo obscurecido, descendente fio de pólvora seca, armadilha na hora de jantar, sestas dormidas no sofá, repetidamente, sesta atrás de sesta, como se anulasse o dia e fizesse de mim uma ópera de sono, os olhos fechados, o eu antes de ter um eu com as portas fechadas. na coluna da música ele repete, eu estou bem, eu estou bem, eu estou bem, e quando eu penso em sossego penso sempre em inexistente, e quando eu penso em relaxado penso sempre em impossível, conto os dias até ao próximo encontro, nunca estou lá bem, mas quero sempre mais.

e se fosse eu o culpado, pergunto-me, e se tiver sido só eu a fechar as portas, sem haver ninguém nem perigo algum, como, aliás, é o que me parece que acontece todos os dias que tenho medo, perigo algum para me atacar. páro. recomeço. corro em direcção às pessoas, mas é só uma ilusão que me crio. na verdade, todo este movimento sou eu a fugir, a fugir para muito longe, como as lágrimas fogem dos olhos e vão cair, descendentes, no teu pescoço algures, onde eu nunca o encontrei.

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