mas que horas são, que horas são? é de noite ainda e chove. lembro-me de ter andado pela rua, de ter estranhado, tanta gente a andar de um lado para o outro. falava, sim, falava ao telefone como quem voa, na madrugada do pai natal. sim, chovia, mas eu não dei por nada. bêbedo que nem um cacho, sinto no corpo o calor agradável do vinho do jantar.
abro a caixa de correio e em vez de cartas pedras, em vez de mensagens fugas, em vez de anjos corvos marinhos. estendo as pernas no sofá da sala, doiem-me as costas. é bom saber que se lembram de nós, mesmo quando se lembram de nós. eu tenho a pele das mãos seca, pergunto-te se a chuva ajuda, mas tu só sorris e coras, como as bonecas do cinema.
um dia ainda uma pedra me vai acertar, penso eu, enquanto acendo um cigarro e o deixo queimar-se no cinzeiro da sala. tenho um homem de guitarra a tocar-me ao ouvido e eu finjo que sou mais alto que o mundo, mais crente que a própria religião. digo coisas em que ninguém acredita e acredito que existem coisas que ninguém diz. em alguma parte de tudo isto eu hei-de ter razão.
Arquivo do extinto blogue Esferovite- a vida em pedaços (13-08-2003/ 4-01-2006)
sábado, dezembro 25, 2004
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