vi-o no jornal, há uns dias, numa fotografia de há muitos anos atrás. estava sentado, calmo, calmíssimo. na mão direita, um copo de vinho, pela metade. pode-se, à primeira, pensar que o vinho se irá entornar, existissem uns olhos de sono atrás daqueles óculos, debaixo daquelq chapéu de lavrador. mas olhando bem, o que há por ali é harmonia. não sei porquê, mas imagino aquela sala a meia luz, silenciosa. só o clack da máquina fotográfica. sim, vivíamos nos anos setenta.
naquele tempo a música ouvia-se em gira-discos e os amigos encontravam-se uns aos outros junto à porta de casa de cada um. certamente não haveria muito para onde ir, a concentração era inevitavel. as pessoas, essas, eram também em menor número. mas isso agora não me interessa nada. o que me interessa é o facto de naquela noite, sim, porque só à noite se bebe vinho à média luz, naquela noite ele ficou só em casa, bebendo vinho, com alguém que lhe tirava fotografias. fosse quem fosse, estava por ele apaixonado. não tenho dúvidas. mais ninguém capta almas com máquinas fotográficas. só os apaixonados.
passados todos estes anos, olho a fotografia e apaixono-me. apaixono-me involuntariamente, rapidamente, como sempre me apaixono. esta semana a palavra amor rodeia muitas das palavras que profiro. não consigo explicar, só desconfio que me queira apaixonar. quanto mais impossível uma coisa nos parece, mais a queremos próxima de nós. e por isso vos lembro esta fotografia. não pelo homem, nem pelo vinho. pelo amor. pelo amor de uma lente fotográfica.
Arquivo do extinto blogue Esferovite- a vida em pedaços (13-08-2003/ 4-01-2006)
quinta-feira, agosto 05, 2004
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1 comentário:
eu gosto é destas coisas meu querido!
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