Arquivo do extinto blogue Esferovite- a vida em pedaços (13-08-2003/ 4-01-2006)

terça-feira, agosto 03, 2004

se até eu me faço mal

eu poderia antes dizer: tu vês a maneira como aquela pessoa anda pela rua: mas não, digamos que existem umas centenas de pessoas iguais a passar por aqui e por isso não adianta explicitar nenhuma característica desta pessoa em particular: ainda que a maneira como ele anda é evidentemente desastrada: mas também me parece muito mais importante destacar os escaldões deitados na praia neste dia de chuva: sim, chouveu lá na minha terra, há quem diga que pouco, eu não me molhei.

o que se vê da marginal são um monte de prédios separados por correntes de ar: lá ao fundo vê-se sintra mas só quando não faz nevoeiro: pela trafaria passam barcos grandes de milionários, embora não exista nenhum milionário na trafaria, nem nenhum milionário saiba que aquela esquina entre o rio e o mar tem esse nome: quando eu era pequena corria para as praias do fundo: na paragem do autocarro estão uma dezena de pessoas como as do parágrafo de cima, estão à espera do autocarro dos TST, estão infelizes, chove-lhes em cima: assim na rua como em casa, amén.

escrevo no caderno dos recados: vim o caminho todo até casa a gritar com a cassete dos beatles e sim, chorei: estava sozinho no carro e pûs os óculos escuros para ninguém ver: eu diria sempre que não mas hoje: é normal, meu querido, é normal: chorei mais quando ouvia o all you need is love: é normal, meu querido, é normal: abri a janela do carro, tinha óculos escuros, gritei: love, love, love: para uma senhora que via passar os carros e agora digo: é normal, é normal, se até eu me faço mal.

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