Arquivo do extinto blogue Esferovite- a vida em pedaços (13-08-2003/ 4-01-2006)

sábado, setembro 13, 2003

velho 1 (edit version)

eu não gosto muito de falar, não gosto mesmo, até porque, a maior parte das vezes, também não tenho muita coisa para dizer. por isso o mais normal é verem-me sentado naqueles banquinhos em frente ao café central, entre os carros que passam e a sombra que, ao início da tarde, pouco me toca, mas que depois me vai encobrindo todo da cabeça até aos pés, e lá para o final da tarde, sinto uma alegre frescura que se me estende pela pele toda. como não gosto muito de falar, a malta vai-se sentando ao meu lado, sem dizer grande coisa, só um boa tarde em tom calão, enquanto eu aceno a cabeça e fecho os olhos que trago escondidos atrás dos óculos.
como podem imaginar, a minha vida não é nada interessante. desde que a fábrica fechou, lá em baixo, na cidade, eu não saio muito daqui. ando entre o café central e a minha casa. as coisas já não são como eram. aqui havia muita animação. a malta saía toda para a cidade, de manhã, era uma confusão de carrinhas e autocarros... agora não... sobram uns velhos, como eu, aqui sentados neste banco. estamos a ver os carros a passar. um ou outro fala da bola. eu não falo muito. fico a ouvi-los. não tenho muito para dizer.
aqui o banco do café central é que é um sítio bom para o que gosto de fazer. posso ficar sentado e vejo quase tudo o que se passa na aldeia. as pessoas que chegam e partem, as conversas das vizinhas, as discussões dos namorados...eu não falo muito e pouca coisa acontece na minha vida. mas tenho muita curiosidade pela vida dos outros.não sei porquê, cada vez mais gosto de saber o que fazem os outros, o que pensam os outros, o que sentem os outros. não sei se é por não ter mais nada que fazer. mas meto-me na vida dos outros. isto dantes era tão animado. e eu não tenho nada para dizer.

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