encontrei-o a passear sozinho na rua às 3 ou 4 da matina, andava eu meio perdido pelas ruazinhas pequenas da parte velha da cidade à procura de alguém que me pudesse arranjar um cigarro. parei o carro e deixei-o ficar quase preso contra a parede. baixei o vidro e disse-lhe que vinha em paz. o gajo sorriu, meio aliviado. será que tens um cigarro que me arranjes? o gajo riu-se outra vez. achei que aquilo não tinha piada nenhuma. era tarde, estava frio, tanto eu como ele deveríamos estar a caminho de casa. eu tentava despachar a cena e ele só se ria. mandei-o pró caralho e arranquei. no entanto, vi pelo retrovisor que o gajo se tinha posto no meio da estrada a acenar-me, como se eu estivesse a partir de viagem para muito longe. Travei e fiz marcha-atrás. voltei a fazer-lhe a mesma cena, de vidro aberto, será que me arranjas um cigarro, caralho, arranjas ou não? o gajo balbuciou umas quantas palavras. não percebi nada, o cabrão era alemão.
mandei-o entrar para o carro e continuei na minha busca por cigarros, agora com a complementaridade de também procurar cerveja para o sacana do camone que trazia comigo. o gajo fartava-se de falar coisas que eu não percebia. ao fim de uns tantos quarteirões encontrei um bar de alterne que talvez nos pudesse salvar. olhei pra ele e, amigo, não é grande coisa, mas a esta hora ninguém nos arranja melhor. pelo menos era um sítio limpinho, apesar de os preços serem o que são e de termos que aguentar com umas quantas brasileiras a imitarem as gajas do canal 18. pedimos duas cervejas e um maço de cigarros. o alemão ria-se e falava comigo como se eu fosse da terra dele. eu bebi o meu copo sossegado e fumei dois cigarros. o gajo insistiu em pagar-me outro copo e eu não tive como recusar. o gajo falava, falava, falava, e embora eu não percebesse patavina do que ele me queria dizer, acenava a cabeça e comecei a ver que o gajo estava a contar-me a vida dele. és um existencialista de merda, disse-lhe. o gajo ria-se e continuava a falar. parecia ter uma perspectiva bastante irónica das merdas todas que lhe tinham acontecido na vida. seriam talvez as mulheres e os empregos e essas tretas que a malta tem a mania que servem para nos fazer pensar e até, para os mais complicados, sofrer. continuamos a beber e o gajo quase que chorava. quando o dono do bar nos mandou embora, o gajo enconstou-se à parede, já na rua, a chorar baba e ranho e a dizer coisas que, não sabendo o que era, me parecia fodido. fico sempre irritadiço quando tenho sono. peguei-lhe na cara e disse-lhe, amigo, sabes o que tu és? tu és é um granda... granda... o gajo não me percebe, filho da puta, mas será que alguém me ensina como dizer neurótico em alemão?
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quinta-feira, setembro 25, 2003
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