verónica decidiu morrer mas petra prefere ficar sentada, na paragem do autocarro, quando são sete e pouco da tarde e ela sabe que a carreira 17 parará por ali em segundos. agora é como rezar o terço, missão dia a dia cumprida, naquela mesma hora sagrada do seu amor sair do emprego. a primeira vez foi por acaso. passava ali vinda do supermercado e vê-o despedir-se de uma rapariga bem jovem e atiçada com um beijo muito perto dos lábios. demasiado perto. chegou-se junto deles e disse olá.
o amor está cheio de demónios e casas desfeitas. petra gostava de legos quando era pequena e ainda hoje tem a mania das pequenas construções. mesmo aquelas que demoram anos a acertar as medidas, como a sua história com o amor da vida dela. ele sempre muito gel e barba feita só para ir ali ao café. ela sempre muito atrás dele. o namoro demorou o tempo que ele levou a perceber que ela iria ser para sempre a mulher que ia cuidar dele. ele pensava que ia ser tudo igual. ela sabia que nunca nada iria ser diferente.
agora passam as noites juntos a ver filmes repetidos no canal hollywood. ele vai enchendo e esvaziando copos de whisky, ela excita-se devagar com o bafo quente do álcool a exalar daquele corpo aos seus olhos perfeito. desde o dia do beijo do autocarro, ela segue-lhe ainda mais os passos e ele já percebeu que não se pisa ramo verde quando não se quer acordar a criança. trata-a bem, no seu intricado modo de ser homem. petra adormece a sonhar com princesas e castelos côr-de-rosa. a vida segue dentro do seu círculo habitual.
Arquivo do extinto blogue Esferovite- a vida em pedaços (13-08-2003/ 4-01-2006)
domingo, setembro 12, 2004
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