tenho uma caneta guardada dentro do casaco. pareço um mágico. uma caneta, dizem, e lá está ela na minha mão. saiu da manga? tenho uma caneta. o sol está do lado de lá do prédio. não entra pela janela desta sala desarrumada. temos os papéis espalhados sobre uma mesa, uma mesa velha, de trabalho. falamos sempre a olhar para as paredes. quando eu olho para ti, falas tu a olhar para a parede. quando tu olhas para mim, falo eu a olhar para a parede. às vezes também olho para as minhas mãos.
não te oiço, só consigo imaginar o que poderias dizer com esses gestos que fazes com as mãos. não te oiço, não sou capaz de ouvir. olho-te quando falas, como se esperasse que dissesses alguma coisa como, quero estar contigo, olho as tuas mãos como se me pudessem tocar, essas coisas do costume. combinamos ficar calados sobre certos assuntos, aqueles assuntos que nenhum de nós sabe como vai acabar. a vida pode ser assim, não pode? e já não estou a gostar do que estou aqui a dizer.
porque eu tenho uma caneta no bolso, tenho os papéis. mas não me podem obrigar a escrever. estou sentado, a cadeira incomoda-me o hábito de estar sempre sentado nesta cadeira. tu falas, sem eu ouvir. o que é que tu ouves quando eu digo, não vou dizer? não me podes obrigar a escrever porque quando o faço, tu não me lês. e por isso eu fico calado quando te encontro, evitando o medo de me entenderes mal, de ficares sem me responder ali à minha frente. a vida pode ser assim, não pode? e já não estou a gostar.
Arquivo do extinto blogue Esferovite- a vida em pedaços (13-08-2003/ 4-01-2006)
quinta-feira, janeiro 13, 2005
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